novembro 06, 2011

**************** SALA VIP: “O GRANDE DITADOR”

charlie chaplin

ISTO NÃO é uma CRÍTICA CINEMATOGRÁFICA

SINOPSE: Um país da Europa, a Tomânia - é governado por um terrível ditador chamado Astolf Hynkel, líder de um governo que persegue violentamente os judeus. Não bastasse isso, Hynkel ainda pretende iniciar uma guerra para invadir um país vizinho e escravizar seu povo. Um pacato e simpático judeu, que vive em Tomânia, sofreu amnésia e por isso parece alheio a tudo isso. E o que é mais incrível: ele é um sósia perfeito do ditador. A Europa e o mundo conseguirão livrar-se da megalomania e ânsia de poder de Hynkel? Haverá uma chance para a paz?

À GUISA da HISTÓRIA

O filme é uma evidente paródia que arremessa críticas duras e contundentes ao nazi-fascismo. Hynkel é o alter ego de Hitler, e Benzino Napoloni é o de Mussolini. Goebbels, ministro da propaganda de Hitler, recebe o nome de Garbitsch, do inglês garbage, que significa lixo.

chaplin e paulette goddard
Chaplin e Hitler nasceram no mesmo ano (1889), no mesmo mês (de abril) e ambos usavam o mesmo tipo de bigode. Desse detalhe nasceu a ideia dos idealizadores do filme de recorrer ao engraçado Carlitos para caricaturizar Adolf Hitler. Chaplin teria começado a desenvolver a ideia em 1938. O roteiro ficou pronto no final do primeiro semestre de 1939; três meses depois, quando eram rodadas as primeiras cenas do filme, Hitler ordenava a invasão da Polônia, dando início à Segunda Guerra Mundial. Por isso, O GRANDE DITADOR também é um registro daquele momento histórico angustiante, de confronto entre os nazi-fascistas e os ditos defensores das liberdades democráticas.

Em O GRANDE DITADOR, Chaplin, que era um inglês de ascendência franco-judaica por parte do pai, e irlandesa e cigana por parte da mãe, denuncia o anti-semitismo de Hitler; no filme os judeus são mostrados vivendo isolados e são perseguidos e humilhados pelas tropas de assalto de Hynkel, uma cala alusão aos guetos onde os judeus foram obrigados a viver antes de serem transferidos para os campos de extermínio nazistas. O holocausto é por demais conhecido e comentado; nunca é demais, porém, nos lembrarmos dele.

No filme, as incoerências do discurso racista de Hitler também servem de piada. Em um dos diálogos, por exemplo, Garbitsch, a caricatura de Goebbels, estimula a vaidade do ditador dizendo-lhe que ele era o único moreno a reinar num mundo de loiros, uma clara referência ao fato de Hitler não se parecer em nada com o tipo ariano idealizado por ele: loiro, olhos azuis, alto e atlético.

O filme inicia-se com uma seqüência ambientada na Primeira Guerra Mundial, em que vemos Carlitos, na figura de um barbeiro judeu, lutando como soldado no exército da Alemanha / Tomânia. Essa seqüência é elucidativa de um fato que Hitler fazia questão de omitir: o de que na Primeira Guerra Mundial os judeus alemães lutaram pela Alemanha e sofreram com a derrota do país, em 1917.

Após essa seqüência inicial, o filme avança alguns anos, quando a Tomânia / Alemanha, já se encontra “reerguida”, “reconstruída” por Hynkel / Hitler. Os discursos inflamados de Hynkel lembram os de Hitler nos mínimos detalhes, até mesmo nos trejeitos. Num lance de genialidade, e utilizando-se apenas de gestos e ondulações de voz, Chaplin, que também faz o papel de Hynkel, consegue sugerir o ódio contido nesses discursos proferidos em uma língua inventada por Chaplin, cujo som lembra o alemão. Num dos momentos mais engraçados do filme, o discurso do ditador é tão feroz que faz os microfones “se afastarem de medo”. O tradutor oficial do discurso se limita a dizer que Hynkel / Hitler estava expressando suas “opiniões” a respeito do povo judeu.

chaplin e jack oakie
A incoerência e a megalomania do ditador também são ironizadas em várias seqüências. Numa delas, que se tornou clássica, Hynkel / Hitler dança com um balão em forma de globo terrestre e, durante a brincadeira, o balão acaba estourando. A cena simboliza com maestria que os sonhos de conquista do ditador poderiam ter um final trágico para ele, o que de fato aconteceu.

O grande ditador usa recursos da comédia, da tragédia e do drama para caracterizar a oposição ética e política entre o barbeiro judeu / Carlitos e o ditador Hynkel, evidenciando que, apesar de usarem bigodes idênticos, eram muito diferentes entre si. Depois da seqüência inicial, ambientada na Primeira Guerra, alternam-se com freqüência as cenas de Hynkel, no seu palácio, com as do barbeiro judeu, no seu trabalho. O barbeiro ama a meiga Hannah e sonha em viver com ela num lugar livre. Já o ditador é cercado por mulheres que o obedecem por temor, mesmo quando são maltratadas. Tudo indica que o pobre barbeiro é feliz, enquanto seu sósia não.


Em O GRANDE DITADOR, Chaplin decide fazer Carlitos falar, mas continua usando a pantomima para desenvolver sua narrativa. E a utiliza com grande maestria. Muitas vezes é como se estivéssemos assistindo a um filme mudo. Talvez seja justamente por seu talento mímico que Chaplin conseguiu cravar em nossa memória a seqüência emblemática cuja força visual supera qualquer discurso: aquela em que Hynkel, em seus sonhos de grandeza, baila e brinca com um balão em forma de globo terrestre. O filme foi proibido nos países do Eixo e seus aliados, e enfrentou problemas na época ao ser exibido nos EUA. Como os EUA ainda não estavam oficialmente na guerra, um filme tão declaradamente anti-nazista quanto O GRANDE DITADOR poderia acarretar problemas diplomáticos com a Alemanha. Na Espanha, o filme só estreou em 1976, com o fim da ditadura do General Franco e a volta das eleições no país.

O filme chega ao ápice quando Carlitos toma o lugar de Hynkel e profere um discurso cuja mensagem permanece tão atual quanto da primeira vez em que foi proferido. Eis alguns de seus trechos:

Sinto muito, mas não pretendo ser um imperador. Não é esse o meu ofício. Não pretendo governar ou conquistar quem quer que seja. Gostaria de ajudar - se possível – judeus, o gentio... negros... brancos. [...]

O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém, nos extraviamos. A cobiça envenenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódio... e tem-nos feito marchar em passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido. [...]

paulette e chaplin

Carlitos / barbeiro judeu, confundido agora com o ditador, tinha decidido falar. Falou para pedir mais solidariedade, mais bondade e mais união entre os seres humanos. Suas palavras tinham tanta eloqüência e expressividade quanto seus gestos; estava mais que provado que suas insistência em fazer filmes mudos tinha sido uma opção. O filme foi indicado para o Oscar de Melhor Ator, Melhor Música, Melhor Filme, Melhor Ator Coadjuvante e Melhor Roteiro Original. 

Texto de NINA RIZZI
poeta e blogueira

chaplin e jack oakie

O GRANDE DITADOR
The Great Dictador
(1940)

País: EUA
Duração: 125 min.
P & B
Produção, Direção e Roteiro
Charles Chaplin (United Artists)
Fotografia: Karl Struss e Roland Totheroh
Edição: Willard Nico
Música: Meredith Willson
Cenografia: J. Russell Spencer (d. a.) 
Edward G. Boye (déc.)
Vestuário: Wyn Ritchie
Elenco: Charles Chaplin (“Hynkel /O barbeiro judeu”,
Paulette Goddard (“Hannah”), Jack Oakie (“Napaloni”),
Henry Daniell (“Garbitsch”), Reginald Gardiner 
(“Schultz”),Billy Gilbert, Maurice Moscovich, 
Carter De Haven, Grace Hayle e Emma Dunn

Nota: ***** (ótimo)

Prêmio: Melhor Ator do New York Film Critics Awards


20 comentários:

nina rizzi disse...

Grata pelo convite e publicação, Nahud.

Um beijo.

M. disse...

Oi Antonio!

Esse filme de Charles Chaplin é indispensável em nossa videoteca! Um grande filme e o último discurso nos faz arrancar lágrimas. Chaplin era um grande gênio, e no caso deste filme, uma pessoa de muita coragem. Afinal uma das funções do cinema é denunciar a realidade social e também reconstruir a história.
Excelente post!
Grande abraço e ótimo domingo!

João Roque disse...

Isto não é um filme, é mais que isso, é uma obra de arte!

Adalberto Meireles disse...

Ótima lembrança, Antonio Júnior. Pena que a figura de Charles Chaplin (e seu insuperável personagem) esteja cada vez mais esquecida das gerações mais novas.

Quanto a Woody Allen, li alguma coisa sobre o novo filme dele e as filmagens em Roma há alguns meses e me permiti fazer algumas especulações sobre uma possível homenagem a Fellini e A Doce Vida. Quando puder dê uma passada no .C de Cinema.

Gilberto Carlos disse...

Antonio, por coincidência assisti a esse filme ontem. Realmente um grande clássico do cinema, que infelizmente custou caro a Chaplin que alguns anos depois foi praticamente expulso dos Estados Unidos, já que o país tentava o isolacionismo.

P.S. A cena do globo foi também abertura da novela O dono do mundo (1991) da Rede Globo.

Tarsila Xavier disse...

ASSISTI ONTEM NO TELECINE CULT!!!!

Marcelo Castro Moraes disse...

Chaplin foi um homem a frente do seu tempo. Usava humor para fazer sua critica pessoal com relação ao mundo em que vivia. Foi assim Com tempos Modernos e não foi diferente com esse, que profetizou o pior que estaria por vir durante a 2ª guerra, e o melhor que poderia fazer, era declarar sua opção de “paz no mundo”, em um discurso que deve ter mexido com todos os setores da época, e ainda mexe atualmente.
Chaplin merece sempre em revisada em seus filmes, e se dar conta, que eles jamais envelhecem, provando que ele tinha uma mente aberta e sabia do que viria acontecer mais para frente, seja com o mundo, seja com o mundo do cinema.
Com isso, se alguém me dissesse, qual seria a imagem que representasse o cinema como um todo, esse seria a imagem de Chaplin, seja numa cena de O Garoto, Tempos Modernos, Grande Ditador, Luzes da Cidade e etc. Chaplin era isso e ainda é, o melhor que soube usar o cinema como arte e que soube extrair os seus sentimentos e colocá-los em película.

Unknown disse...

Filme maravilhoso.. arte, crítica, emoção.. Atemporal!

Uma relíquia, de fato!

Bela homenagem!


;D

DARCI FONSECA disse...

Olá, Antônio
Seu blog é uma referência no gênero. Obrigatório para todos que amam o cinema. Sou um dos seguidores fiéis.
Um abraço do Darci

Ailton Monteiro disse...

Longa vida a Woody Allen!!

Tanise Silveira disse...

bem legal aqui! ;D
obrigado pela visita no meu blog,
beijos & boa semana! ;*

disse...

Excelente! Só essa palavra poderia resumir um filme como O Grande Ditador, prova de que Chaplin estava atento ao que acontecia no mundo e usou com maestria o humor para mostrar a realidade ao público americano.

Eduardo Cambuí Jr disse...

E aí, Antonio!

Esse filme é, sem dúvida, a prova que o artista precisa se pronunciar sobre as coisas do seu tempo. Acho que a crítica que Chaplin fazia era a que mais incomodava, pois era feita satirizando os dramas da época. O filme foi um grand-finale para o vagabundo!

Valeu!

Anônimo disse...

Olá Falcão, seu post me fez conhecer um pouco mais a estória de Chaplin. Então vou responder sua pergunta, pena que não posso colocar a mandala astrológica natal de Hitler e Chaplin aqui no seu blog.
Existe importância do dia de nascimento de um mapa natal, principalmente a de Hitler. Ele não era Ariano, ele era Taurino, ou seja, Sol de Touro. Por coincidência Hitler e minha mãe eram de 20 de Abril. Mas minha mãe atingiu os 29 graus em Áries, sendo que quando calculamos o mapa de Hitler já cai a 0 graus de Touro. As vibrações dos dois signos existe já que ocupa grau anarético, isso na astrologia cármica tem uma importância fundamental. Charles Spencer Chaplin tinha 27 graus em Áries, Lua de Escorpião, Ascendente em Escorpião, ele era profundo e seus olhos diziam tudo, rsrs, pois é, a parte dos olhos de escorpião é expressiva. Podemos até avaliar a sinastria de Adolf Hitler e Chaplin como a Vênus de Chaplin retrograda em Touro na Casa 7 trouxe a atração do outro que seria Touro (Hitler) para ele, uma energia que não estava dentro de Chaplin, mas ao fazer um trabalho representando a figura Hitler o fez talvez ficar pensativo, acredito eu, que ele não imaginava o que ele atraiu (projeção). Deve ter sido um momento muito importante e de reflexão para sua vida. Hitler tinha uma interceptação de casa 3 e 9 em câncer e capricórnio, possuidor de uma Lua Capricorniana, ele era frio, calculista, não demonstrava amor. Diz o livro Dorotheé na Astrologia Cármica que ele tinha uma casa 8 assombrada. Lembrando que a casa 8 é a casa de Escorpião, ele era magnético, ele com 4 planetas ali transformava o valor do outro. Só que sua tarefa era Nodo Norte em Câncer na casa 9, ele não uso o livre arbítrio para ser uma grande família, e sim trouxe a destruição de nações, ele não entendeu o caminho. Vou colocar as duas mandalas no meu blog, assim você conseguirá ver as diferenças e talvez queira entrar nesse mundo fantástico que é a Astrologia. Cynthia.

Pena disse...

Estimado e Admirável Amigo:
Em curtas palavras, pura e simplesmente fabuloso.
Como consegue ser tão talentoso e brilhante no que faz?
Excelente.
Um delicioso sentir perfeito das telas do sonho.
Abraço forte de amizade perante tanto talento.
No maior respeito.
Sempre a admirá-lo

pena

Adorei. Fantástico.

Guará Matos disse...

O Grande Ditador é espetacular, assisti um catau de vezes e é exultante.
Abraços.

AnnaStesia disse...

Tenho que parabenizar a Nina pelo belo texto e o Antônio pela iniciativa. O grande ditador é o meu segundo favorito de Chaplin (o primeiro é Tempos modernos). Filme maravilhoso, importante e essencial para qualquer cinéfilo. Desnecessário dizer que Charlie era um gênio e assistir sua obra é sempre um prazer inenarrável!

AnnaStesia disse...

Ah sim! Não posso deixar de dizer que sou fã incondicional do Sr. Allen e que a expectativa por seu próximo filme sempre é gigantesca. Vida longa a Woody!

linezinha disse...

Chaplin foi incrivel com seu filme O Grande Ditador.

Rubi disse...

Tratando-se de Charlie Chaplin, fica difícil comentar sobre suas produções; são todas ótimas! Depois de Tempos Modernos, esse é o meu preferido!