junho 21, 2011

************ SALA VIP: “A PELE do DESEJO”

greta scacchi


Guardo boa recordação da película A PELE do DESEJO (Salt on Our Skin), de Andrew Birkin, com os excelentes Greta Scacchi (“Verão Vermelho / Heat and Dust”, de James Ivory) e Vincent D´Onofrio (“Nascido para Matar / Full Metal Jacket”, de Kubrick). Os protagonistas terminaram por se casar na vida real e tiveram uma filha, Leila, no mesmo ano do filme. Baseado no romance da escritora, jornalista e feminista francesa Benoîte Croult, o filme é uma história de amor. Ele se chama Gavin MacCall e ela George McEwan. Ele a ama mais que ela a ele, porque os homens sempre amam mais que as mulheres embora demonstrem o contrário. Pede-a em casamento, porém ela não aceita. Não lhe parece um bom partido, não é do seu nível: ela é uma universitária com um brilhante futuro e ele um simples pescador de um pequeno porto na Irlanda. 

Ele a adora sempre com um amor silencioso, profundo, sofrido, mas se casa sem amor com uma amiga de infância e tem três filhos. Ela também se casa, tem um filho e se divorcia. Seus encontros são uma vez ao ano: ele voa de um continente a outro, cruzando o oceano, para estar com ela somente uma semana e para dizer o quanto a quer. Ela o espera a cada ano com mais ansiedade. Ele não se importa que sua esposa saiba desta relação e sofra com as viagens anuais ao outro lado do mundo, e padece em silêncio. Certa vez, promete regressar como sempre no ano seguinte, porém algo inesperado acontece e ela tem que procurá-lo no seu país... O romance foi chamado de feminista, o filme também. Tem seus admiradores - entre eles, eu - e adversários. “Ela o usava, o desejava, mas não o amava”, disseram. A autora Benoîte Croult sempre defendia a sua personagem: “Ela o amou... Eu sei que o amou, porque ela sou eu. É minha vida...”. Para analisar esta obra delicada, convidei a poeta GENNY XAVIER.


OPOSTOS à FLOR da PELE

“Ah, meu amor, sejamos verdadeiros
Um com o outro! Pois o mundo, que parece
À nossa frente uma paisagem de sonho,
Tão nova, tão bela, tão variada,
Em realidade não tem nem luz, nem amor, nem alegria,
Nem certeza, nem paz, nem qualquer consolação.”

(Trecho do poema “Dover Beach”, de Matthew Arnold, 
uma referência nas vozes dos protagonistas de “A Pele do Desejo”)

Minhas leituras são como fruta doce numa boca ávida de doçuras, e aguçam meus sentidos que se aninham na poderosa fonte do imaginário. Quando as leituras se materializam na tela do cinema ainda mais me trazem um prazer fartamente saciado. Para mim, um exemplo disso é o livro A PELE do DESEJO - título original: “Les Vaisseurs Du Coeur”, de 1988 -, da escritora francesa Benoîte Groult, que também virou filme com roteiro e direção do talentoso Andrew Birkin, em 1992, intitulado “Salt on Our Skin”. Benoîte é um tipo de escritora que revela muito de si em suas obras, que narra com ímpeto, paixão e talento, seja do ponto de vista da autobiografia como na construção de suas personagens ficcionais. Uma mulher de personalidade própria, com grande consciência feminina e feminista, que viveu e experimentou seus sonhos e as realidades da sua época. Em A PELE do DESEJO, a escritora nos põe diante das possibilidades do amor, mesmo quando se vive uma história à parte, alimentada fora das barreiras sociais e intelectuais ou além do tempo e das distâncias.   

Lembro bem das impressões que tive a cerca da leitura do livro e, logo depois, do filme. Sempre faço isso quando uma obra de arte me chama atenção, procuro refletir sobre o que mais me toca e sensibiliza. Com a história de A PELE DO DESEJO foi assim. Um relato de como a vida, num átimo de instante, pode nos confrontar com tudo aquilo que julgamos ser o oposto de nós, o contrário daquilo que idealizamos e que, por cautela, temor ou preconceito, refutamos. A história mostra a trajetória de vida de duas pessoas de classes sociais e universos culturais diferentes. Ele (Gavin), um simples pescador escocês, com pouca instrução escolar; ela (George), uma intelectual francesa, professora de literatura de requintada educação. Ao tornarem-se amantes ambos percebem que não é possível ter uma vida juntos, entretanto, o afeto que não conseguem evitar sempre os põem à prova, fazendo-os rever suas decisões e conceitos pré-estabelecidos. Recheado de belas descrições das várias paisagens por onde a trama se desenrola, de diálogos ricos e profundos e de uma bela química entre os protagonistas, a obra é uma sensível reflexão sobre a necessidade que temos do “outro” e de como o tempo surpreendentemente é capaz de desfazer nossos equívocos.

Enfim,  ao pensar nas voltas e  reviravoltas existenciais traçadas  pelos  protagonistas  de A PELE do DESEJO, eu inevitavelmente penso em quantas histórias reais já se perderam por conta da falta de coragem que as pessoas têm de serem ousadas, de enfrentarem seus desafios diante daquilo que lhes desarmam ou que lhes escapam da cômoda condição das relações convencionalmente compatíveis. Por isso tudo e para que o leitor pense sobre os sentidos que a vida nos transmite suas lições através da inventividade dos artistas que criam suas obras de arte a partir da transgressão da realidade, eu deixo um pequeno fragmento da narrativa de Groult, no trecho em que o protagonista escreve para sua amada: "Antes eu tinha a impressão de que os dias eram todos parecidos e que eles iam ser parecidos até eu morrer. Até que conheci você... e não me peça para explicar. Só sei que quero segurá-la na minha vida, e nos meus braços de vez em quando, se você concordar. Você considera o que acontece com a gente é um pouco como uma doença. Se é doença, eu não quero me curar. A idéia de que você existe em algum lugar e de que você pensa em mim às vezes me ajuda a viver."

Texto de 
GENNY XAVIER
Poeta, Ficcionista e Professora de Literatura. 
Autora do blog literário “Baú de Guardados” 


A PELE do DESEJO
SALT ON OUR SKIN
(1992)

Gênero: Drama
País: Alemanha, Canadá e França
Duração: 111 mins.
Cor
Produção: Bernd Eichinger, Edwin Leicht 
e Martin Moszkowicz (Canal 2 Plus, Neue Constantin Film e RTL Plus)
Direção: Andrew Birkin
Roteiro: Andrew Birkin e Bee Gilbert
Adaptação do romance de Benoîte Groult
Fotografia: Dietrich Lohmann
Edição: Dagmar Hirtz
Música: Klaus Doldinger
Cenografia: Robert W. Laing e Jean-Baptiste Tard
(des. prod.) Zoe MacLeod (d.a.)
Vestuário: Catherine Leterrier
Elenco: Greta Scacchi (“George”), Vincent D’Onofrio
(“Gavin”), Anais Jeanneret, Hanns Zischler
e Claudine Auger

Nota: *** (bom)


18 comentários:

M. disse...

Bela postagem! Preciso ver este filme. Uma ótima semana para vc.

Henrique Wagner disse...

Não conhecia o filme do Andrew Birkin. E com esse sobrenome, deve ser parente - quem sabe filho? - da Jane Birkin, não? Eu realmente não sei. Gosto muito da Greta Scacchi. Além de muito boa atriz, uma mulher extremamente elegante. Quanto ao texto da Genny Xavier, não entendi o que ela quer dizer com a expressão "átimo de instante": átimo não é instante? Desse modo, estaríamos nós, leitores, diante de um grave pleonasmo? Além do mais, a expressão não é nada eufônica, arranha o ouvido. Abç.

ari rodrigues disse...

Bela leitura do clássico“Les Vaisseurs Du Coeur” ou A Pele o desejo em película, feita pela poetisa e escritora itabunense Genny Xavier, que tenho orgulho em chamá-la de amiga.
Parabéns!
Ari Rodrigues-editor do jornal Itabuna Cultura & Arte

Kley disse...

Isso não é um texto, é uma poesia. Um jogo de palavras que seduzem e encantam. Belíssimo texto, Genny Xavier.

Leandro Afonso Guimarães disse...

Sabe como gosto do espaço, Antonio, mas é bom (re)ler Genny Xavier. Nunca vi filme nem livro, mas entraram na fila.

Marcelo Castro Moraes disse...

Que bom essa reviravolta de Patino na carreira, mesmo não sendo no cinema. Para mim, ele é protagonista de inumeras cenas classicas do cinema e bom exemplo disso é a cena do restaurante no Primeiro Poderoso Chefão, magistral.

linezinha disse...

Eu não conhecia nem o filme e nem o livro "A Pele do desejo" e esse texto da Genny Xavier ta excelente vou procurar conhecer essa obra

Genny Xavier disse...

Querido Antonio,

Agradeço pela publicação do meu texto e parebenizo pela bela postagem sobre Elvis.
Transmita também minhas desculpas a Henrique Wagner por haver "arranhado" seus tímpanos com o uso do pleonasmo da expressão tão pouco 'eufônica'. Ainda bem que existem os críticos e suas ácidas gentilezas, não é? São bem necessários aos falíveis humanos que lidam com as palavras por gosto e sensibilidade.
Beijos,
Genny

Faroeste disse...

Pacino, um ator de estirpe maior dentro do cenário cinematográfico amreicano, impõe em nós, seus fãs, uma espécie de necessidade de vê-lo constantemente nas telas. E quando esta preciosidade de ator passa um tempo sem atuar, preocupamo-nos como o mesmo, já que não é mais nenhum rapazinho na flor de sua mocidade.
jurandir_lima@bol.com.br

Henrique Wagner disse...

Sugiro à professora de Literatura um cuidado maior, antes de pubiclar - tornar público - um texto. Um "átimo de instante" não é o único erro gramatical (de estilo) - isso porque não sei se se tratou, no caso da Genny, de um erro semântico mesmo - da postagem, e nem o mais grave. Hà ainda a expressão "a cerca da leitura do livro", quando o correto é "acerca da leitura". Pular a cerca é outra história... E há ainda o erro de concordância: "o afeto que não conseguem evitar sempre os põem à prova". O afeto os põe, não?

H.

debora disse...

vi na teve esse filme é uma linda e triste história de amor

Henrique Wagner disse...

Hoje fiquei sabendo que o Andrew Birkin filmou o primeiro romance do Ian McEwan... O jardim de cimento. Acontece que ainda não chegou ao Brasil... Adoro o McEwan. Estou na fila.

Rita Santana disse...

Genny, parabéns! O seu texto provocou o desejo de assistir ao filme e o farei em breve. Um grande beijo! Antônio, grata pelas palavras no blog.

jmjasabia disse...

Amo este filme!!! Gosto da narrativa e fezme interessar por Benoite Groult. Alias esta lançou o livro "Minha Fuga". Greta e Vicent estao primorosos neste filme!!! E no meu blog também tem uma crítica: http://jmjasabia.blogspot.com/2008/11/estou-trabalhando-na-livraria-do.html.

Rosane Martins disse...

De vez em quando este filme volta à minha memória, portanto não é "esquecível"... Embora eu não conheça ninguém que o tenha visto o comentário de Genny é exatamente o que eu sempre pensei sobre a história. As escolhas que fazemos, nossa arrogância... Acho que vou amar este filme para sempre...

Anônimo disse...

Sempre amei esse filme!!!

La Troiana disse...

Esse filme, a sua banda sonora, a obra de Benoîte Groult são simplesmente deliciosos. No fim a emoção ganha à razão porque só assim o ser humano consegue ser feliz. O amor é a razão de existimos, só ele vale verdadeiramente a pena no fim. E Groult como feminista deixou uma mensagem ao mundo: as mulheres devem conquistar o seu lugar, mas todas as lutas são vãs se não deixarem entrar o amor nas suas vidas. Isso não as enfraquece. Deve sim torná-las mais fortes. O tempo é curto. Não se percam. Sejam felizes.

Guiga disse...

onde consigo assistir esse filme?